STF condena os oito réus do Núcleo 1 da ação por tentativa de golpe de Estado , veja como votou cada ministro

AÇÃO PENAL AP2668: Julgamento do mérito foi concluído na tarde desta quinta-feira, com votos da ministra Cármen Lúcia e do ministro Cristiano Zanin. Sessão prossegue com o exame das penas a serem aplicadas a cada réu

STF condena os oito réus do Núcleo 1 da ação por tentativa de golpe de Estado , veja como votou cada ministro
Julgamento AP2668 - Supremo Tribunal Federal - Foto: Gustavo Moreno/STF

 [Aroni Fagundes | Repórter/Editor]

[Conteúdo: https://noticias.stf.jus.br]

A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) condenou os oito réus que integram o Núcleo 1 da tentativa de golpe de Estado. Na tarde desta quinta-feira, o colegiado concluiu a apresentação dos votos da Ação Penal (AP) 2668. A sessão de julgamento prossegue com a discussão da chamada dosimetria, em que são definidas as penas a serem aplicadas a cada réu.

A AP 2668 tem como réus os oito integrantes do Núcleo 1 da tentativa de golpe, ou “Núcleo Crucial”, segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR): o deputado federal Alexandre Ramagem, ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin); o almirante Almir Garnier, ex-comandante da Marinha; Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança Pública do DF; o general Augusto Heleno, ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI); o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro (réu-colaborador); o ex-presidente da República Jair Bolsonaro; o general Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa; e o general da reserva Walter Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil e da Defesa.

Sete réus foram condenados pelos crimes de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, participação em organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado. No caso de Alexandre Ramagem, a parte relativa a fatos ocorridos após sua diplomação, em dezembro de 2022, como deputado federal (dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado) está suspensa até o término do mandato.

O placar que definiu a condenação do Núcleo 1 foi de quatro a um. A ministra Cármen Lúcia e o ministro Cristiano Zanin, presidente da Turma, foram os dois últimos a votar. Eles acompanharam o relator, ministro Alexandre de Moraes, e o ministro Flávio Dino, que proferiram votos na última terça (9). A única divergência foi do ministro Luiz Fux, que votou na quarta (10) pela condenação de dois réus em apenas um dos crimes pelos quais respondiam e pela absolvição dos demais.

O ministro Alexandre de Moraes, relator da Ação Penal (AP) 2668 sobre tentativa de golpe de Estado, votou pela condenação dos oito réus do Núcleo 1, ou “Núcleo Crucial”. A sessão da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal na manhã desta quarta-feira (9) foi dedicada ao voto do ministro, que apresentou uma sequência de ações que, segundo ele, mostram que a organização criminosa agiu de forma coordenada para atingir seus objetivos.

Para sete réus, a condenação diz respeito aos crimes de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado de Direito, golpe de Estado, dano qualificado e deterioração do patrimônio tombado. Esses dois últimos crimes só ficaram de fora da condenação do réu Alexandre Ramagem, em razão da suspensão da tramitação da AP em relação a esses delitos pela Câmara dos Deputados, por envolverem fatos ocorridos após sua diplomação como deputado federal.

O ministro Alexandre de Moraes também rejeitou as preliminares (questões processuais anteriores ao mérito) levantadas pelas defesas.


Ministro Alexandrfe de Moares - Foto: Gustavo Moreno STF

Réus
Estão sendo julgados:

 – o deputado federal Alexandre Ramagem, ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin);
 – o almirante Almir Garnier, ex-comandante da Marinha;
 – Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança Pública do DF;
 – o general Augusto Heleno, ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI);
 – o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro (réu colaborador);
 – o ex-presidente da República Jair Bolsonaro;
 – o general Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa;
 – o general da reserva Walter Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil e da Defesa.

Organização criminosa
O relator afirmou que a ação penal se baseou nas provas apresentadas pela Polícia Federal, com respeito ao contraditório, à ampla defesa e ao devido processo legal. A organização criminosa narrada pela acusação iniciou sua prática em meados de julho de 2021 e permaneceu atuante até 8 de janeiro de 2023. O grupo foi composto, em sua maioria, por integrantes do governo federal na época e por militares das Forças Armadas e teve o “claro objetivo de impedir e restringir o pleno exercício dos poderes constituídos e, em especial, o Poder Judiciário”, além de tentar impedir a posse ou depor o governo legitimamente eleito em outubro de 2022.

A fim de demonstrar que o grupo atuou de forma organizada, permanente e hierarquizada, o ministro mostrou, com auxílio de slides, a estrutura da trama golpista e uma sequência de ações planejadas ou colocadas em prática para atingir seus objetivos.
Entre os episódios citados estão as ameaças feitas à Justiça Eleitoral em lives; a reunião ministerial de 5/7/2022 e a reunião com embaixadores em 18/7/2022; a utilização indevida da Polícia Rodoviária Federal (PRF) para dificultar o deslocamento de eleitores no segundo turno das eleições; e o uso das Forças Armadas com a produção de relatório do Ministério da Defesa sobre as urnas.

Agenda, live e reunião ministerial
Segundo o ministro, a estruturação dos atos para a execução da trama golpista ficou evidenciada na live realizada em 29/7/2021, em que Jair Bolsonaro contestou a transparência do sistema eleitoral. Ele ressaltou a participação de milícias digitais e observou que o discurso usado na live foi o mesmo adotado posteriormente por pessoas presas em decorrência dos atos de 8 de janeiro de 2023.

A reunião ministerial de 5/7/2022, para o ministro Alexandre, “foi uma reunião golpista, em que se pretendia arregimentar mais servidores e, principalmente, os comandantes das Forças para essa organização criminosa”. Termos tratados naquela reunião resultariam posteriormente na chamada minuta do golpe.

Sobre a reunião com embaixadores no Palácio do Planalto, em 18/7/2022, o ministro afirmou que ela foi usada para propagar desinformação. “Não há ilegalidade em se reunir com embaixadores, mas o conteúdo da reunião atentava contra a democracia e o Poder Judiciário”.

Diplomação, minuta e “Punhal Verde e Amarelo“
O ministro Alexandre de Moraes lembrou também os atos de 12/12/2022, dia da diplomação do presidente eleito no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), e, dias depois, a tentativa de atentado a bomba na região do aeroporto de Brasília. Sobre o planejamento de ações da denominada operação Punhal Verde e Amarelo, apresentou o documento detalhado do plano, com divisão de tarefas para matar o presidente eleito, seu vice e o presidente do TSE. “Isso não foi impresso em uma gruta, mas dentro do Palácio do Planalto”, afirmou. Ele observou que a divisão de tarefas “foi hierarquizada sob a liderança de Jair Bolsonaro”, com fartas provas no processo.

Para o relator, não é possível normalizar essa sequência de fatos desde 2021. “O Brasil demorou para atingir sua democracia. Tivemos 20 anos de ditadura, de tortura, de desrespeito aos Poderes Judiciário e Legislativo. As pessoas desapareciam, as pessoas eram mortas. Não é possível banalizar o retorno a esses momentos obscuros da história”, ressaltou.

Confira, abaixo, os principais pontos apresentados pelo ministro Alexandre sobre a conduta dos réus.
Alexandre Ramagem
O relator destacou que o ex-diretor da Abin agiu para descredibilizar o processo eleitoral. O réu confirmou a autoria do documento denominado “Presidente TSE”, com argumentos contrários ao sistema eletrônico e com imputações de fraudes às urnas, de conteúdo idêntico ao apresentado na live de julho de 2021. Em mensagem trocada com o ex-presidente Bolsonaro, Ramagem diz que “a urna eletrônica já se encontra em total descrédito perante a população”. “Isso não é uma mensagem de um delinquente do PCC para outro. Isso é uma mensagem do diretor da Abin para o então presidente da República”, disse o ministro.

Almir Garnier
Entre as condutas do ex-comandante da Marinha, o ministro destacou que ele participou das reuniões com os comandantes das Forças Armadas em que foram discutidas propostas para decretação do estado de defesa e foi o único a colocar suas tropas “à disposição do presidente”. Apontou, ainda, que no dia da votação de uma proposta de emenda à Constituição sobre voto impresso, Garnier promoveu um desfile de blindados em frente ao Congresso Nacional. “É golpista quem pede e quem oferece as tropas para quebrar o Estado Democrático de Direito”.

Anderson Torres
O relator destacou o fato de que a Polícia Rodoviária Federal, responsável pelos bloqueios nas estradas no segundo turno da eleição de 2022 em localidades onde o então candidato Luiz Inácio Lula da Silva teve mais votos, era subordinada ao ex-ministro da Justiça. Lembrou, ainda, a participação de Torres na reunião ministerial de 5/7/2022, que tinha o objetivo de mobilizar os comandantes das Forças Armadas para aderir ao golpe.

Augusto Heleno
O ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional afirmou na reunião ministerial de 5/7/2022 que, “se tiver que dar soco na mesa, é antes das eleições” e apontou a necessidade de agir contra determinadas pessoas e instituições. Para o relator, isso demonstra a concordância de Heleno com a utilização de medidas de exceção para que o grupo se mantivesse no poder. Também lembrou a agenda do general, apreendida nas investigações. “Não é razoável achar normal um general quatro estrelas e ministro do GSI ter uma agenda com anotações golpistas, preparando a execução de atos para deslegitimar as eleições e o Poder Judiciário e para se perpetuar no poder”, ponderou o relator.

Jair Bolsonaro
Segundo o ministro Alexandre, o ex-presidente exerceu a função de líder da estrutura criminosa e recebeu ampla contribuição de integrantes do governo federal e das Forças Armadas, usando a estrutura do Estado brasileiro para implementação de seu projeto autoritário de poder. “Jair Messias Bolsonaro foi fundamental para reunir indivíduos de extrema confiança do alto escalão do governo que integravam o núcleo central da organização criminosa”, afirmou. Este núcleo também tinha integrantes militares que ocupavam cargos estratégicos dentro do Executivo federal.

Mauro Cid
O ministro destacou que o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro e réu delator não apenas tinha conhecimento direto dos planos golpistas como atuou ativamente em sua preparação. Ele participou de reuniões em que se discutia a ruptura institucional, ajudou a imprimir versões das minutas do golpe e esteve em conversas sobre o financiamento das ações. Cid também foi citado nas tratativas que envolveram empresários do agronegócio, apontados como potenciais financiadores da operação, com a compra de celulares e chips para viabilizar a execução dos planos e a mobilização para os ataques de 8 de janeiro de 2023.

Paulo Sérgio Nogueira
Segundo o ministro Alexandre, o então ministro da Defesa criou e conduziu uma comissão no ministério para elaborar um relatório que sugerisse fraudes nas urnas eletrônicas. A iniciativa, determinada por Bolsonaro, foi discutida em reuniões. Como o documento concluiu pela total lisura do sistema, Paulo Sérgio atendeu a ordens do então presidente da República e atrasou a divulgação do relatório. Em novembro, já após o segundo turno, o general atendeu a nova ordem de Bolsonaro e divulgou “uma das notas oficiais mais esdrúxulas e vergonhosas que um ministro da Defesa possa ter emitido”. O texto tentava disfarçar a conclusão sobre a lisura das eleições a fim de manter artificialmente a narrativa de fraude eleitoral.

Walter Braga Netto
O relator afirmou, entre outros pontos, que o general foi o responsável por manter contato com líderes dos acampamentos montados em frente aos quartéis do Exército. Para o ministro Alexandre, a declaração do ex-ministro da Defesa em que dizia aos apoiadores para não perderem a fé é uma “clara confissão de unidade de desígnios para a prática da tentativa de golpe militar do dia 8 de janeiro de 2023”.

Preliminares
Antes de abordar o mérito, o relator rejeitou todas as preliminares que já tinham sido negadas pela Primeira Turma do STF quando a denúncia foi aceita. Entre elas estão as alegações de excesso de documentos no processo, cerceamento de defesa e incompetência do STF e da Turma para julgar o caso.

Sobre a validade da delação premiada de Mauro Cid, o ministro lembrou que a própria defesa negou qualquer coação. Também afastou o argumento de falta de concordância da PGR, uma vez que o STF já decidiu que a colaboração premiada pode ser feita pela Polícia Federal. Quanto a possíveis contradições ou omissões nos depoimentos (oito no total, sobre fatos distintos), afirmou que isso não invalida a delação, mas pode levar à revisão ou à redução dos benefícios.

Ele ainda considerou irrelevantes questões como o vazamento de áudios, o suposto uso de perfil falso no Instagram e outros questionamentos.

Segundo a votar, ministro Flávio Dino se posiciona pela condenação de réus por tentativa de golpe
Ministro, porém, ponderou que alguns réus podem ter penas menores


Ministro Flávio Dino - Foto: Gustavo Moreno/STF

O ministro Flávio Dino votou na tarde desta terça-feira (9) para condenar os oito réus acusados de tentar um golpe de Estado para impedir a posse do governo eleito em 2022. Ele seguiu o voto do relator da Ação Penal (AP) 2668, ministro Alexandre de Moraes, pela condenação dos réus, mas ponderou que a pena deve ser menor para alguns deles. Até o momento, são dois votos na Primeira Turma a favor da condenação dos réus. O próximo a se manifestar é o ministro Luiz Fux, a partir da manhã de quarta-feira (10).

Dino foi o segundo a votar no julgamento, após o relator. Ambos defendem a condenação de todos os réus pelos crimes de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado de Direito e golpe de Estado. Com exceção do réu Alexandre Ramagem, que teve parte da ação penal suspensa pela Câmara, os ministros também votaram para condenar os demais pelos crimes de dano qualificado e deterioração do patrimônio tombado.

Quem são
Estão sendo julgados:

– o deputado federal Alexandre Ramagem, ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin);
– o almirante Almir Garnier, ex-comandante da Marinha;
– Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança Pública do DF;
– o general Augusto Heleno, ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI);
– o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro (réu colaborador);
– o ex-presidente da República Jair Bolsonaro;
– o general Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa;
– o general da reserva Walter Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil e da Defesa.

Condenações e participação
Em seu voto, Flávio Dino listou as condutas imputadas pela Procuradoria-Geral da República (PGR) a todos os réus da ação, como base de seu voto pela condenação. Contudo, fez uma ressalva em relação ao relator, pois apontou uma participação de menor importância para três deles: Alexandre Ramagem, Augusto Heleno e Paulo Sérgio Nogueira.

Para o trio, Dino viu condutas limitadas no tempo, ou que deixam de ser citadas na denúncia. O ministro não avançou em seu voto sobre o tamanho das penas, mas disse que vai considerar a possibilidade de aplicar uma redução, com fundamento no artigo 29 do Código Penal, que admite a diminuição na medida da culpabilidade de cada réu.

Normalidade
Dino destacou que há uma “absoluta normalidade” em relação aos critérios técnicos do julgamento. Conforme o ministro, o que torna o caso diferente são fatores externos ao processo, mas que não impactam sua análise. “Há argumentos pessoais, agressões, coações, ameaças até de governos estrangeiros”, afirmou. “Não há julgamento aqui de uma posição política A ou B, até porque há investigações no STF com políticos de todos os partidos, conduzidas de modo igualitário”. Dino também observou que o STF não está julgando as Forças Armadas.

O ministro também defendeu que os atos apontados na denúncia não foram apenas “atos preparatórios”, mas fizeram parte da execução da tentativa de golpe. Segundo Dino, houve materialmente o início da execução do núcleo dos crimes, que prevê a punição pela tentativa de cometimento.

Outro ponto ressaltado pelo ministro foi a presença de violência e grave ameaça nos atos praticados. Ele citou, entre outros, a invasão violenta da Esplanada dos Ministérios e da Praça dos Três Poderes no dia 8 de janeiro de 2023, o rompimento de barreiras policiais, o acampamento em frente a quartéis, a ameaça de não cumprir ordens judiciais, o desfile de tanques, o bloqueio de rodovias federais e os ataques à sede da Polícia Federal.

Ministro Luiz Fux absolve seis réus na ação sobre golpe de Estado
Seu voto condena Mauro Cid e Braga Netto por tentativa de abolição violenta do Estado de Direito. Julgamento será retomado nesta quinta-feira (11) às 14h


Ministro Luiz Fux - Foto: Victor Piemonte/STF

O ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), concluiu na noite desta quarta-feira (10) seu voto na Ação Penal (AP) 2668, votando pela absolvição de Almir Garnier, Jair Bolsonaro, Alexandre Ramagem, Paulo Sérgio Nogueira, Augusto Heleno e Anderson Torres das acusações da Procuradoria-Geral da República (PGR) relativas à tentativa de golpe de Estado. Ele votou pela condenação de Mauro Cid e Walter Braga Netto apenas pelo crime de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito. O julgamento será retomado nesta quinta-feira (11), às 14h.

Fux divergiu dos ministros Alexandre de Moraes (relator) e Flávio Dino, que haviam votado para condenar os réus por todos os delitos de que são acusados: tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, participação em organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado. O julgamento continua com os votos da ministra Cármen Lúcia e do presidente da Turma, Cristiano Zanin.

Preliminares
Na sessão da manhã, Fux abriu a divergência pelas questões preliminares. Ele entendeu que o STF é incompetente para analisar o caso e que o processo deveria ser anulado. Mas, se for reconhecida a competência da Corte, o ministro defendeu que o caso deveria ser julgado pelo Plenário, e não pela Turma. Fux também considerou que houve cerceamento da defesa, em razão do tempo curto para examinar o grande volume de documentos dos autos.

Sobre a colaboração premiada, ele seguiu o relator e validou o acordo firmado pelo tenente-coronel Mauro Cid.

Organização criminosa
Para Fux, os fatos narrados na acusação não permitem sua classificação como crime de organização criminosa, pois a Procuradoria-Geral da República (PGR) não comprovou que houve uma associação permanente de pessoas para a prática de crimes, de forma estruturada e ordenada e com divisão de tarefas. O ministro também afastou o agravante de organização criminosa armada, por falta de prova do efetivo emprego da arma de fogo na atividade criminosa.

Golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito
Em relação ao primeiro crime, Fux considera que ele requer a deposição violenta do governo legitimamente constituído. Mesmo um “autogolpe” para prolongar indevidamente a permanência no poder não se enquadra no crime de golpe de Estado, já que não há deposição de um governo eleito.

Para a configuração do segundo crime, o ministro entende que é necessário que a conduta seja capaz de criar um perigo real e que haja intenção de derrubar todos os elementos da democracia, como a liberdade de expressão, o voto, a separação de Poderes e a soberania da Constituição. Acampamentos, faixas e aglomerações são manifestações políticas e não configuram crime.

Mauro Cid
Fux votou para condenar o colaborador pelo delito de abolição do Estado Democrático de Direito. O ministro entende que a PGR comprovou que Cid concordava com a execução de atos criminosos e de natureza violenta e sabia dos planos “Punhal Verde e Amarelo” e “Copa 2022”, por ter participado de reuniões preparatórias, conseguido financiamento para sua execução e solicitado o monitoramento do ministro Alexandre de Moraes, uma das autoridades a serem eliminadas.

Almir Garnier
O ex-comandante da Marinha foi absolvido de todas as acusações. Para o ministro, a PGR não apresentou provas de sua adesão a uma tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito, e o fato de Garnier ter participado passivamente de reuniões e ter dito que colocaria as tropas à disposição não corresponde a um auxílio material concreto.

Jair Bolsonaro
O ministro Luiz Fux votou pela absolvição do ex-presidente de todas as acusações. Segundo ele, os fatos narrados pela PGR não correspondem ao crime de golpe de Estado, que prevê a deposição do governante, pois o presidente na época era o próprio Bolsonaro. Para o ministro, também não é possível dizer que os crimes praticados nos atos de 8 de janeiro de 2023 seriam decorrência de discursos e entrevistas do ex-presidente ao longo do mandato.

Alexandre Ramagem
Para Fux, a ação penal em relação ao deputado federal e ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) deve ser suspensa em relação a todos os crimes atribuídos a ele, e não apenas aos que ocorreram após sua diplomação. De acordo com o ministro, os crimes são permanentes, ou seja, continuaram a ocorrer mesmo após a diplomação.

Walter Braga Netto
Fux votou pela condenação do ex-ministro da Casa Civil e da Defesa por tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito. De acordo com o ministro, ficou comprovado que o general planejou e financiou atos para a execução do ministro Alexandre de Moraes, o que, a seu ver, causaria comoção social, colocaria em risco a separação de Poderes e a alternância de poder e provocaria a erosão da confiança da população nas instituições.

Paulo Sérgio Nogueira
Para Fux, o ex-ministro da Defesa deve ser absolvido de todas as acusações. De acordo com o ministro, a PGR não comprovou que o general tenha praticado algum ato, ajuste, instigação ou auxílio material para a tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito.

Augusto Heleno
O ministro votou pela absolvição do ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) por todos os crimes de que foi acusado. Fux afirmou que crítica às instituições não é crime. Apontou, ainda, que as anotações na agenda do general sobre o processo de votação, demonstrando desconfiança nas urnas eletrônicas, eram rudimentares e de caráter privado, inviabilizando sua utilização como prova.

Anderson Torres
Fux votou para absolver o ex-ministro da Justiça de todas as acusações. Para o ministro, não ficou comprovado que as blitze da Polícia Rodoviária Federal no segundo turno das eleições tenham sido ordenadas pelo ex-ministro. Também entende que Torres, que ocupava o cargo de secretário de Segurança do Distrito Federal e estava fora do país em 8 de janeiro de 2023, não pode ser responsabilizado pelos danos decorrentes dos atos antidemocráticos, pois a responsabilidade seria da Polícia Militar.

STF condena os oito réus do Núcleo 1 da ação por tentativa de golpe de Estado
Julgamento do mérito foi concluído na tarde desta quinta-feira, com votos da ministra Cármen Lúcia e do ministro Cristiano Zanin.

Ministra Carmem Lucia – Foto:STF/Divulgação

Segundo a ministra, desde 2021, cultivou-se no país “um terreno social e político para semear o grão maligno da antidemocracia”, a fim de romper um ciclo democrático de quase quatro décadas no Brasil. Esse conjunto de acontecimentos, no sentido de insuflar a população, culminou nos atos de 8 de janeiro. “O 8 de janeiro de 2023 não foi um acontecimento banal depois de um almoço de domingo, quando as pessoas saíram a passear”, disse.

Na avaliação da ministra, a PGR provou a existência de uma organização criminosa, liderada pelo então presidente Jair Bolsonaro, que implementou um plano progressivo e sistemático de ataque às instituições, a fim de prejudicar a alternância de poder e minar o livre exercício dos Poderes constitucionais, especialmente do Judiciário. Para isso, se utilizou de uma milícia digital que propagou ataques ao sistema eleitoral e às urnas eletrônicas.

Ainda de acordo com a ministra, a acusação comprovou um conjunto de práticas pensadas e executadas para uma radicalização social e política, com a finalidade de fabricar uma crise que daria condições para o golpe. “A tentativa de abolir o Estado Democrático de Direito e a tentativa de golpe de Estado deixam patente que se trata de crime tentado, porque se fosse exaurido não estaríamos aqui a julgar”, afirmou.

O ministro Cristiano Zanin rejeitou todas as preliminares apresentadas pelas defesas. Reafirmou a competência do STF e da Primeira Turma para julgar o caso, destacou que os advogados tiveram acesso às provas e concluiu não haver vícios na colaboração premiada que deu origem às investigações.


Ministro Cristiano Zanin – Foto: Antonio Augusto/STF

Segundo o ministro, a Procuradoria-Geral da República descreveu de forma satisfatória a existência de uma organização criminosa armada, estruturada hierarquicamente, com divisão de tarefas e voltada a um projeto de poder que tinha como objetivo manter Jair Bolsonaro no comando do país, mediante a prática de atos ilícitos. “A responsabilização adequada e nos termos da lei dos agentes que buscam a ruptura institucional é elemento fundamental para a pacificação social e a consolidação do Estado Democrático de Direito”, afirmou Zanin.

O ministro destacou ainda que o chamado Núcleo 1 recorria a táticas de intimidação contra autoridades da República, disfarçadas de críticas à sua atuação, mas sustentadas em informações sabidamente falsas. Mencionou também a iminência de recorrer às Forças Armadas para impor sua vontade. “Trata-se de um expediente ameaçador voltado a constranger o livre exercício dos Poderes constituídos”, observou.