AÇÃO PENAL 2668: concluídas sustentações orais das defesas dos réus por tentativa de golpe de Estado
JUDICIÁRIO/STF: Julgamento será retomado na próxima terça-feira (9) com o voto do relator, ministro Alexandre de Moraes
03/09/2025 17:43:13

{Aroni Fagundes | Repórter/Editor}
A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) ouviu, na manhã desta quarta-feira (3), os argumentos apresentados em favor do general da reserva e ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional Augusto Heleno, do ex-presidente da República Jair Bolsonaro, do general e ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira e do general da reserva e ex-ministro da Casa Civil Walter Braga Netto.
Com a sessão de hoje, foram encerradas as sustentações orais das defesas dos oito réus do Núcleo 1, ou “Núcleo Crucial”, da denúncia na Ação Penal (AP) 2668, que trata da tentativa de golpe de Estado. Na tarde de ontem, foram ouvidos os advogados do tenente-coronel e ex-ajudante de ordens de Bolsonaro Mauro Cid, do deputado federal e ex-diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) Alexandre Ramagem, do almirante e ex-comandante da Marinha Almir Garnier Santos e do ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal Anderson Torres.
O julgamento será retomado na próxima terça-feira (9), às 9h, com o voto do relator, ministro Alexandre de Moraes.
Augusto Heleno
O advogado Matheus Mayer Milanez pediu a absolvição do ex-chefe do GSI, alegando nulidade de provas. Ele contestou o material produzido pela Polícia Federal (PF) que embasou a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) e disse que a defesa recebeu, às vésperas do depoimento, arquivos compactados com dezenas de terabytes, o que teria dificultado o acesso às informações.
Milanez sustentou que não há provas que vinculem Heleno a qualquer articulação golpista, aos atos de 8 de janeiro, à operação “Punhal Verde e Amarelo”, à politização do GSI ou a iniciativas de espionagem pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin). Também afirmou que seu cliente teve o direito ao silêncio violado e criticou a atuação do relator durante os interrogatórios.
O advogado sustentou ainda que a PF manipulou anotações da agenda pessoal de Heleno para criar uma narrativa artificial de protagonismo. “Não houve rompimento de Bolsonaro com Heleno, mas um afastamento, que é comprovado. E, mesmo assim, não foi total, pois ele permaneceu no governo”, afirmou.
Jair Bolsonaro
O advogado Celso Sanchez Vilardi alegou cerceamento de defesa, afirmando que não teve acesso integral às provas nem prazo razoável para analisá-las. Segundo ele, a falta de paridade de armas prejudicou o trabalho da defesa, já que PF e Ministério Público Federal (MPF) dispuseram de mais tempo para examinar o material. Vilardi também disse que o réu colaborador Mauro Cid apresentou versões contraditórias, inclusive sobre um perfil falso no Instagram, vinculado ao seu e-mail. Para o advogado, a conduta é incontestável e compromete a credibilidade de Cid.
O advogado acrescentou ainda que Bolsonaro determinou a transição de governo e pediu que o novo ministro da Defesa fosse recebido, o que demonstraria sua disposição de assegurar a transmissão do cargo. Por fim, sustentou que não houve tentativa de abolir o Estado Democrático de Direito, pois não houve violência ou grave ameaça, requisitos previstos no Código Penal.
O advogado Paulo Cunha Bueno, que também representa Bolsonaro, reforçou a tese de que os crimes apontados exigiriam atos concretos, e não apenas intenções. Ele defendeu que o ex-presidente não iniciou nenhum protocolo para decretar estado de defesa ou de sítio e que não há documento que indique essa intenção.
Paulo Sérgio Nogueira
O advogado Andrew Fernandes Farias afirmou que os elementos do processo demonstram a inocência do ex-ministro da Defesa e destacou que tanto Mauro Cid quanto o brigadeiro Baptista Júnior confirmaram que ele atuou para dissuadir Bolsonaro de medidas de exceção e aconselhou o reconhecimento do resultado eleitoral.
A defesa rebateu quatro pontos da acusação. Sobre a reunião de 5 de julho de 2022, disse que a fala de Nogueira foi apenas um desabafo. Quanto ao relatório das Forças Armadas sobre urnas eletrônicas, lembrou que o documento foi entregue em novembro de 2022, dentro do prazo previsto. Em relação à nota de 10 de novembro de 2022, afirmou que o documento apenas esclarecia a finalidade do relatório, sem ligação com fraude eleitoral. Sobre a reunião de 14 de dezembro, negou qualquer pressão sobre comandantes militares e ressaltou que o general Freire Gomes declarou não ter sido instigado.
O advogado concluiu afirmando que Nogueira sempre se opôs a qualquer insurreição e buscou evitar que radicais influenciassem o então presidente.
Walter Braga Netto
O advogado José Luís Oliveira Lima também alegou cerceamento de defesa e criticou o prazo curto para acesso aos autos e a decisão do relator de não permitir a gravação da acareação entre seu cliente e Mauro Cid.
Oliveira Lima apontou vícios na delação de Cid, como a ausência inicial do Ministério Público na negociação do acordo, a falta de provas e a dúvida sobre a voluntariedade do delator, que teria se sentido coagido. Segundo o advogado, as acusações contra Braga Netto se baseiam essencialmente na delação e em apenas oito prints de mensagens supostamente adulterados.
Ainda de acordo com o defensor, Cid mudou sete vezes a versão sobre uma reunião na casa do general e sobre a suposta entrega de dinheiro para financiar o golpe. “Cid não se lembra como, quando, onde, por qual motivo e em quais circunstâncias teria ocorrido a entrega”, afirmou, acrescentando que seu cliente está preso apenas com base nesses relatos.
Mauro Cid
Em nome do ex-ajudante de ordens da Presidência da República no governo de Jair Bolsonaro, o advogado Jair Alves Ferreira defendeu a validade do acordo de colaboração premiada firmado com a Polícia Federal e homologado pelo STF. Ele rebateu alegações de coação e afirmou que Cid foi orientado e acompanhado por seus defensores em todos os atos processuais.
Ferreira sustentou ainda que não houve descumprimento do acordo, o que afastaria os benefícios da delação. Ele afirmou que, embora a delação em si não seja prova, os fatos narrados foram úteis para que a acusação obtivesse elementos sobre os outros réus.
Também defendeu a manutenção do acordo ajustado com a Polícia Federal, que prevê perdão judicial, e não a proposta da Procuradoria-Geral da República de redução de um terço da pena que venha a ser imposta.
Também representando Mauro Cid, o advogado Cezar Bitencourt assegurou que o tenente-coronel não incentivou atos golpistas contra a democracia ou o sistema eleitoral. Segundo a defesa, embora tenha recebido diversas mensagens sobre fraude nas urnas eletrônicas, ele não as repassou nem reagiu a elas. Ainda de acordo com Bittencourt, as conexões com os demais réus são abstratas, e em nenhum momento Cid teria articulado ou aderido a propostas de rompimento da ordem democrática.
Alexandre Ramagem
O advogado do deputado federal e ex-diretor da Abin, Paulo Renato Garcia Cintra Pinto, argumentou inicialmente que a suspensão de parte da ação penal em relação a Ramagem deve abranger também o delito de integrar organização criminosa. Ele destacou que, segundo a PGR, a organização operou entre junho de 2021 e 8 de janeiro de 2023. Nesse sentido, por ser considerado de natureza permanente, o delito teria se prolongado e deve ser abrangido pela resolução da Câmara dos Deputados que determinou a suspensão do processo em relação aos delitos cometidos depois da diplomação.
Em relação às acusações da PGR, o advogado afirmou que seu cliente fazia diversas anotações, mas não há informação nos autos de que os documentos apreendidos em seu computador tenham sido repassados a Jair Bolsonaro. Também negou que Ramagem tenha orientado o ex-presidente a fazer críticas às urnas eletrônicas. Segundo ele, um documento com restrições ao sistema eleitoral era apenas um compilado de pensamentos e das críticas nesse sentido emitidas anteriormente por Bolsonaro.
O defensor refutou também as alegações de que o deputado tenha utilizado indevidamente a estrutura da Abin para fins políticos, com espionagem de adversários e magistrados. Segundo ele, ao contrário, Ramagem teria determinado a realização de procedimentos administrativos para averiguar eventuais desvios na utilização da ferramenta “First Mile”, usada para monitoramento de telefones celulares.
Almir Garnier Santos
O advogado Demóstenes Torres, defensor do almirante e ex-comandante da Marinha, negou que seu cliente tenha oferecido tropas para apoiar medidas autoritárias de manutenção de Jair Bolsonaro no poder.
Outra alegação apresentada pela defesa do almirante é de que a PGR feriu o princípio da congruência ao apontar nas alegações finais dois fatos novos que não estariam na denúncia: o desfile de tanques da Marinha na Praça dos Três Poderes, interpretado como ato simbólico de apoio ao suposto intento golpista, e a ausência de Garnier na cerimônia de passagem de comando da força. Para o advogado, a discrepância fere o devido processo legal. “Caberia à PGR aditar a denúncia ou ao STF desconsiderar esses dois fatos no julgamento”, frisou.
Torres pediu ainda a rescisão da colaboração premiada do tenente-coronel Mauro Cid, uma vez que a própria acusação apontou omissão de fatos graves e narrativa seletiva pelo colaborador. Pontuou, contudo, que a rescisão não implica o desmonte total da ação penal, mas apenas das provas viciadas, mantendo-se válidas as provas produzidas independentemente da colaboração.
Anderson Torres
O advogado Eumar Roberto Novacki, defensor do ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança Pública do DF, apresentou e-mail da empresa aérea Gol e bilhete emitido em 21 de novembro, para afastar a acusação de que Torres teria deixado deliberadamente o país às vésperas dos atos violentos de 8 de janeiro. A prova demonstraria que a viagem com a família foi programada com antecedência, afastando a hipótese de omissão dolosa.
Também segundo o advogado, não há nenhum elemento que comprove que Torres tenha arquitetado qualquer atuação da Polícia Rodoviária Federal visando comprometer a lisura do segundo turno das eleições presidenciais de 2022. De acordo com Novacki, as provas testemunhais evidenciam que o então ministro da Justiça agiu de maneira imparcial, técnica e de acordo com suas atribuições institucionais.
A respeito da denominada “minuta do golpe”, a defesa afirmou que o documento já circulava na internet desde 12 de dezembro de 2022, muito antes de ser encontrado na residência de Torres. Para o advogado, a acusação deu “um peso descomunal de prova” a esse arquivo.
[Conteúdo: https://noticias.stf.jus.br/postsnoticias/ap-2668-concluidas-sustentacoes-orais-das-defesas-dos-reus-por-tentativa-de-golpe-de-estado/ ]